- Sendo assim - disse o gato -, quero prestar-te o serviço; mas não sei porque digo "sendo assim", uma vez que não compreendo nada.
- És formidável - disse o rato.
- Mete a cabeça na minha boca e espera - disse o gato.
- Vai demorar muito tempo? - perguntou o rato.
- O tempo de alguém me pisar o rabo - disse o gato. - tenho de ter reflexos rápidos. Mas vou deixá-lo bem estendido, não tenhas medo.
O rato afastou as mandíbulas do gato e meteu a cabeça entre os seus dentes afiados. Logo a seguir retirou-a.
- Diz-me cá - perguntou -, hoje de manhã comeste tubarão?
- Ouve - disse o gato -, se não te agrada podes pôr-te a mexer. Esses truques não me impressionam. Desenrrasca-te sozinho.
Parecia aborrecido.
- Não te zangues - disse o rato.
Fechou os pequenos olhos pretos e pôs a cabeça em posição. Cauteloso, o gato encostou os caninos acerrados ao pescoço cinzento e delicado. Os bigodes pretos do rato misturaram-se com os seus. Desenrolou a cauda felpuda e deixou-a estender-se no passeio.
Aproximavam-se, a cantar, onze rapariguinhas cegas do Orfanato Júlio o Apostólico.
20 novembro, 2007
Palavras lidas # 32
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