18 julho, 2011

Palavras lidas #174


Que o português se queixa não é novidade. Mas a cultura dos ais é de facto algo muito típico deste país à beira mar plantado. Não se trata só de uma expressão de linguagem, sendo por isso difícil encontrar algo que se assemelhe noutras línguas. Segue o poema de Armindo Mendes de Carvalho, mais conhecido talvez recitado aqui.
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Cantiga dos Ais

Armindo Mendes de Carvalho (1927-1988)
Os ais de todos os dias,
os ais de todas as noites.
Ais do fado e do folclore,
o ai do ó ai ó linda.

Os ais que vêm do peito,
ai pobre dele, coitado
que tão cedo se finou!

Os ais que vêm da alma.
Ais d’ amor e de comédia,
ai pobre da rapariga
que se deixou enganar…
ai a dor daquela mãe.

Os ais que vêm do sexo,
os ais do prazer na cama.
Os ais da pobre senhora
agarrada ao travesseiro
ai que saudades, saudades,
os ais tão cheios de luto
da viúva inconsolável.
Ai pobre daquele velhinho:
-ai que saudades menina,
-ai a velhice é tão triste.

Os ais do rico e do pobre
ai o espinho da rosa
os ais do António Nobre.
Ais do peito e da poesia
e os ais de outras coisas mais.
Ai a dor que tenho aqui,
ai o gajo também é,
ai a vida que tu levas,
ai tu não faças asneiras,
ai mulher és o demónio,
ai que terrível tragédia,
ai a culpa é do António!

Ai os ais de tanta gente…
ai que já é dia oito
ai o que vai ser de nós.

E os ais dos liriquistas
a chorar compreensão?
Ai que vontade de rir.

E os ais de D. Dinis
Ai Deus e u é…

Triste de quem der um ai
sem achar eco em ninguém.
Os ais da vida e da morte
Ai os ais deste país…

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