Os dias em que o jantar era peixe cozido (normalmente as sextas-feiras) eram recheados de queixas e reclamações. O mesmo se passava com as ervilhas e os espinafres, embora esses não tivessem dia definido para aparecer lá por casa.
Lembro-me do garfo fazer inúmeros trajectos pelo prato mas dificilmente chegava às papilas gustativas e quando chegava, pelo tempo que tinha demorado por entre curvas e contracurvas, estava já o peixe frio e sabia ainda pior do que quando estava quente!
Como tinha de o comer, demorasse o tempo que demorasse, e independentemente das reclamações e lágrimas, mais de contrariedade que de desgosto, a minha mãe sempre ía dizendo: “tens muita sorte, há muitos meninos que bem queriam esse peixinho e não o têm para comer”. Como a comunicação social era perita em exibir, na altura, crianças famintas na Etiópia, eram sempre essas as imagens que me vinham à cabeça com tal conversa.
Vem isto a propósito da Cimeira UE-África. Oxalá a agenda não reflicta as primeiras impressões: parece que o mundo parou com a chegada do Mugabe e com a ausência de Brown. O forte de S. Julião da Barra transformou-se num parque de campismo de luxo, e com vista para o mar, com tendas trazidas directamente da Líbia para hospedar Kadhafi que chegou com uma comitiva de 200 pessoas e há três mil policias destacados para esta operação que vai virar Lisboa do avesso.
Em minha casa também. Não me lembro de alguma coisa se ter feito para aliviar a fome dos “meninos” que provavelmente não teriam morrido se estivessem sentados ao meu lado naquelas sextas-feiras de má memoria Mas lá que se falava falava.
06 dezembro, 2007
Memórias # 6
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