10 dezembro, 2006

Requerimento em 30 linhas

Fernando Pessoa, solteiro, maior, abreviado, morador onde Deus é servido conceder-lhe que more, em companhia de diversas aranhas, moscas, mosquitos e outros elementos auxiliares de bom estado das casas e dos somnos; tendo recebido indicação – aliás apenas telephonica – de que poderá ser tratado como (10 linhas) gente a partir de uma data a fixar, e de que o referido tratamento de como se fosse gente seria constituído por, não um beijo, mas a simples promessa d’elle, a ser addiado indefinidamente, e até elle Fernando Pessoa provar que (1) tem 8 mezes de edade, (2) é bonito, (3) existe, (4) agrada à entidade encarregada da distribuição da (20 linhas) mercadoria, e (5) não se suicida antes do assumpto, como era sua obrigação natural; requere, para tranquilidade da pessoa encarregada da distribuição da mercadoria, que lhe seja passado attestado em como (1) não tem 8 mezes de edade, (2) é um estafermo, (3) nem mesmo existe, (4) é desprezado (30 linhas) pela entidade distribuidora, (5) suicidou-se.
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Acabam as 30 linhas.
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Aqui devia por-se “Espera deferimento”, mas não espera nada o
Fernando

ABEL.
18.9.29

(In. Cartas de Amor de Fernando Pessoa, Edições Nova Ática)

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