09 abril, 2010

No Times de hoje #114


Baltasar Garzón é de longe o mais mediático juíz espanhol pela sua carreira investigadora que prima contra a impunidade ao mais alto nível.

Foi Garzón que em 1998 emitiu o mandato de captura internacional a Augusto Pinochet (que tinha ido ao Reino Unido), para que este respondesse perante a justiça espanhola relativamente às acusações de tortura e desaparecimento de cidadãos deste país durante a ditadura Chilena. Pinochet chegou mesmo a ser preso, mas nunca foi extraditado para Espanha por alegadas razões de saúde -- as mesmas que o levaram ao Reino Unido -- tendo por isso regressado ao Chile são e salvo.

Garzón é agora investigado pela justiça espanhola porque em 2008 decidiu investigar o desaparecimento de 113,000 pessoas durante a guerra civil espanhola e os primeiros dez anos de ditadura Franquista. Garzón terá ignorado a lei de amnistia aprovada pelo parlamento espanhol em 1977 que colocou uma pedra sobre as (turvas) águas passadas do início da ditadura e permitiu a transição pacífica após a queda do regime em 1975.

Portugal e Espanha partilharam os infortúnios de ditaduras fascistas durante grande parte do século XX, mas a transição para a democracia não poderia ter sido mais diferente. Em Portugal tivémos uma revolução a fingir -- com flores e sem sangue -- em 1974, tivémos comunismo galopante até 1976 (ano da constituição, qual manifesto Marxista) com militares a fazerem de ministros, nacionalizações até à exaustão, grupos terroristas e atentados, e tivémos ainda mais dez anos de instabilidade política com governos minoritários e fracos que nunca terminavam os seus mandatos e onde se tentaram corrigir os erros dos verões quentes de 74 a 76. Em Espanha após a morte de Franco nos finais de 1975, Juan Carlos -- o designado sucessor -- sobe ao trono e facilita um governo de transição que culminou com a constituição de 1978. A estabilidade política chegou em 1982.

A suave transição terá sido benéfica para a economia espanhola enquanto Portugal perdia uma década cometendo erros clássicos, exemplo do que não se deve fazer nos manuais de economia, e tentando até hoje emendar a mão. O reverso da medalha é que em Espanha as pessoas não saíram à rua para se manifestar, calaram e reprimiram as injustiças passadas, amnistiaram factos por apurar.

De acordo com a lei internacional as amnisitias são ilegais, argumenta Garzón, havendo mesmo um precedente no Chile em que a amnistia não foi considerada, dado que o crime de rapto continua a existir enquanto os corpos não forem encontrados. A discussão legal não pára aqui e Garzón corre mesmo o risco de não voltar mais a exercer o magistério.

O Times traz um breve e inflamado artigo sobre o assunto. A Economist é mais sóbria, como sempre.

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