Fontes de luz, pois não eram outra coisa (eram outra coisa, eu é que não sou capaz
de uma metáfora mais feliz) os dias
que vinham depois de manifestares
pela prática a tua maneira de ver o amor.
Rajadas de alegria (repito que não consigo
encontrar imagens mais claras) a fundirem
a calma por dentro do meu sono
com o desenho de um sorriso a dormir.
Ah, como é alarve o estoicicismo exagerado
e como é pobre a teimosa recordação.
Não falemos do passado, um de nós
registá-lo-á e embora a sua maneira de ver
as coisas não passe de uma maneira
de ver as coisas, chega a ser absurdo
perante o que nos aconteceu verificar
que cada facto foi pelo menos dois.
É tudo uma questão de óptica, mesmo
agora os livros que leio me modificam
e os que leio segunda e terceira vez
a mesma coisa, pergunto-me se ainda
sou eu, tranquilizas-me dizendo talvez.
Uma palavra que te dou, mais
inquieto, uns olhos fechados
que te entrego, tão sincero.
Fontes de luz, rajadas de alegria?
No fim nada de nada, coisa
pouca. Que não cabe na mão
e sobretudo não cabe no coração.
Helder Moura Pereira (1949)
Segredos do Reino Animal