16 junho, 2017

Num país a fingir #58

José Eduardo dos Santos, presidente de Angola desde 1979, não se recandidatará a um sexto mandato (a contar de 1991 quando Angola se tornou uma "democracia multipartidária") nas próximas eleições gerais em Agosto. Talvez a decisão tenha sido condicionada pelas notícias, já antigas, relativas ao seu estado de saúde precário que o tem levado a longas estadias em Barcelona desde 2013

A notícia da hora informa que o MPLA (partido que suporta o governo do presidente de Angola) tem um projecto de lei que prevê a criação do estatuto de presidente emérito para o presidente cessante com um conjunto de alargadas regalias, a saber:

uma pensão vitalícia correspondente a 90% do vencimento durante o último ano de mandato;
- o seu cônjuge também terá uma remuneração equivalente a 70% do vencimento do chefe de Estado ou da respectiva pensão, se por esta optar;
direito à habitação, com a atribuição de uma verba para manutenção e apetrechamento de residência própria;
- direito ao transporte, sendo-lhe atribuída uma viatura automóvel de tipo não inferior à do vice-presidente em exercício para as funções oficiais deste, igualmente um motorista a expensas do Estado, substituição da viatura sempre que devidamente justificado, combustível e manutenção;
pagamento do seguro de responsabilidade civil automóvel contra todos os riscos, viaturas de uso pessoal, para cônjuge e filhos menores ou incapazes a seu cargo;
- o presidente emérito, cônjuge e filhos menores ou incapazes, terão ainda direito à assistência médica e medicamentosa gratuita, passagens aéreas em primeira classe e ajudas de custo, quando viajar em missão de serviço do Estado, dentro e no exterior do país;
- terão também direito a passagens aéreas em primeira classe e ajudas de custo para viagem anual de férias, dentro do país ou no estrangeiro, com direito à protecção especial, pessoal de protecção e assessoria, nas viagens, assim como protecção especial da sua residência.

Propõe o MPLA que seja o dito projecto-lei aprovado antes das eleições de 23 de Agosto porque a partir desse dia Angola terá já um ex-presidente.

Medidas destas chocam em qualquer país, quanto mais em Angola cujo produto per capita fica a menos de metade do nível médio mundial ($6,800 vs $16,300). Na Suécia (com PIB pc de $49,700) chocariam definitivamente mais... num país onde os deputados têm direito a um cartão gratuito para o uso de transportes públicos, é um verdadeiro escândalo haver deputados a usar o dinheiro dos contribuintes para pagar táxis.

2 comentários:

Atlantico Central disse...

A vergonha é tanto maior quanto Angola é um país onde se passa fome, onde o analfabetismo reina, onde existe a mais alta taxa de mortalidade infantil do mundo, onde os hospitais são praticamente primeiros socorros e vivem com pouco mais que o voluntariado.
Como o respeito pelos governados não existe continua o mundo a subsidiar estes presidentes que o vão continuar a ser à custa da miséria humana num dos países que esta gente vetou à pobreza há demasiados anos.

Atlantico Ocidental disse...

Qualquer país com rendimento médio igual à média mundial passa fome. Para termos uma noção, o Iraque com $16,500 de PIBpc está imediatamente acima da média mundial e a Costa Rica com $16,100 imediatamente abaixo (no ranking da CIA, há outros rankings mas as posições dos países não se devem alterar por aí além). Angola, a 40% da média mundial tem dificuldades em muitas áreas, o que torna ainda mais chocante a referida proposta de lei.

A capacidade de tolerar ou não o comportamento dos políticos tem a ver essencialmente com o nível repressão que o regime consegue exercer e com a educação das massas. Infelizmente Angola sofre de ambos os males.