30 junho, 2007

Palavras lidas # 23


"(...)
O ofício de carregador é aliás o mais comum entre os chamados escravos-de-ganho. São estes que carregam as cadeirinhas, as mercadorias, a pedra para as construções. Enfim, do norte ao sul, ou, como aqui se diz, do Oiapoque ao Chui, os negros carregam o Brasil. Nas cidades nada se move sem eles, nada se faz ou constrói, e nos campos coisa alguma se cultiva sem a sua força. Vi, inclusive, um jovem cavalheiro atravessar a rua para comprar um repolho no mercado em frente, e voltar depois, muito esticado, muito digno, seguido de um enorme negro com o seu cesto de verga à cabeça, e dentro dele... o repolho!

Muitos escravos-de-ganho conseguem ao fim de vinte ou vinte e cinco anos comprar a respectiva carta de alforria. Uma vez livres carregam mercadorias outro tanto tempo, noite e dia, até poderem finalmente adquirir um escravo que trabalhe por eles.
(...)"

Nação Crioula, José Eduardo Agualusa, Dom Quixote, 5.ª Edição, pág. 88 e 89

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